segunda-feira, dezembro 22, 2008

A Luz E A Vida

Uma criança pula alegremente no meio da rua agitada.

Passam pessoas de ar apressado, fechado e friorento. Carregam pastas cheias de papel, preocupações, compromissos e vícios próprios do tempo. Passam despercebidas, despercebidas da luz própria do Natal, da música, da vendedora de castanhas, dos embrulhos, despercebidos com a vida.

A luz, a da rua e a da quadra, captam a atenção da criança. Está perdida na fantasia de um mundo que fica para trás. Passa pela rua como quem brinca junto ao rio, descontraída e leve, apreciando a vida no Natal.

Na sua luta diária, a vendedora de castanhas apregoa a sua luz. Está forte e viva na voz. Está triste e zangada na expressão. O peso dos dias passa pelos seus cabelos, pelo ar irrequieto junto com um olhar triste.

Os olhos estão entre as castanhas e as pessoas que passam apressadas. Como seria a luz se fosse ela a passar pela rua? Seria feliz a comprar presentes, sem tempo para julgar a prenda ideal? Seria feliz vivendo mais agitada? Seria feliz vivendo com mais? Seria feliz vivendo com menos tempo para olhar?

No início da rua, uma mulher, com ar elegante e modo seguro, olha fixamente para a montra. A montra brilha, prende a atenção. Lá dentro está a prenda ideal. A mulher revê o seu plano, junta mentalmente o que pode e volta-se novamente para a rua. Não pode ser. A prenda está longe, do outro lado do vidro.

Volta ao seu modo apressado. Pode ser que até ao cimo da rua pare de novo. Já está atrasada. Percebe-se atrasada também nos projectos que idealizou. A prenda ideal deve estar em outro lado também. Talvez.

A chuva cai de repente, bem forte.

A mulher foge para junto de uma montra. A vendedora de castanhas fica debaixo do seu guarda-sol vermelho. A criança está entre as duas, bem no meio da rua.

A sua alegria está muito longe da chuva, continua perto das fantasias e da luz que a rua não deixa fugir.

A mulher olha para a criança e volta ao seu passo apressado, apesar da chuva.

A criança, finalmente molhada, corre para junto da vendedora de castanhas. Ali parecia acolhedor. Todos fugiam da chuva, abrigando-se ou correndo. Eles, continuavam no meio da rua. E a luz brilhava para os dois.

Decido, Logo Engano-me!

1A entrevista de Armindo Abreu da semana passada é desde logo interessante por pouco se ler sobre obras concretas ao longo deste mandato. Tão pouco se fala muito do futuro. Ficamos apenas a saber que Armindo Abreu gostaria de concretizar dois projectos: uma casa de espectáculos e a sempre apregoada conclusão da rede de água e saneamento.

2Para além disso, o que motiva Armindo Abreu é a reabilitação da imagem dos políticos. Como exemplo, refere a luta das últimas eleições para travar Ferreira Torres. Na sua reconhecida boa fé, espera-se que o Presidente da Câmara e líder do PS de Amarante não se esqueça que não travou esse combate sozinho. Antes de tudo, o seu grande mérito foi aproveitar a luta do PSD para preservar a sua base eleitoral durante as eleições de 2005.

3 - Com tão poucas referências a obras concretas para Amarante, não admira que Armindo Abreu tenha dúvidas sobre se é ou não candidato em 2009. Mas por outro lado, a entrevista revela aspectos políticos interessantes, que não disfarçam a absoluta necessidade de ser Armindo Abreu o candidato do PS, por falta de alternativas dentro do partido que sejam capazes de ganhar as eleições em 2009.

4Desde logo, o Armindo Abreu que sempre se viu a defender a mais-valia dos que se dedicam à política dentro dos partidos, revela agora uma abertura inesperada para alguém vindo da sociedade civil, isto mesmo depois de admitir que em 2005 se enganou de forma clamorosa na escolha do engenheiro Carlos Silva para a sua equipa.

5 O mesmo Armindo Abreu que reconhece que o PS lhe deu uma liberdade condicionada para escolha da sua equipa, entre outras coisas por causa da representatividade territorial, reconhece na mesma entrevista que é da opinião que o número dois da próxima equipa do PS deverá continuar a ser uma pessoa do centro da cidade.

6Ainda mais interessante é a abordagem ao comportamento da oposição, nomeadamente do PSD. No início, com Luis Ramos a representar o PSD havia um acordo para uma oposição apenas vigilante. Com a saida de Luis Ramos e a entrada de João Sardoeira o PSD passou a fazer guerrilha, mas “agora as coisas estão mais pacíficas”. Logo a seguir, na mesma entrevista, Armindo Abreu quase parece “chamar” por Luis Ramos de volta, afirmando que com ele talvez certos casos como o da GNR não teriam acontecido.

7Interessante este “piscar de olhos” à direita, inserido numa entrevista com muito mais de política do que de obras e projectos concretos. Estaremos todos à espera das próximas decisões de Armindo Abreu para descobrir se ele se volta a enganar.

 

"IM_Pressões de Direita" in Jornal de Amarante de 11 Dezembro 2008

sexta-feira, dezembro 12, 2008

Polícias E Ladrões

1Vitor Constâncio, governador do Banco de Portugal, deu na segunda-feira uma entrevista televisiva de poucos minutos, em que conseguiu esclarecer muito melhor o caso BPN do que o tinha conseguido fazer no Parlamento alguns dias antes, ao longo de muitas horas.

2Sobre o mesmo tema, o PS impediu a ida de Dias Loureiro ao Parlamento para prestar esclarecimentos, para de seguida acabar por viabilizar um inquérito parlamentar, onde é óbvio que Dias Loureiro terá que ser ouvido.

3 - Vitor Constâncio conseguiu passar melhor a mensagem através da televisão. Dias Loureiro também se viu obrigado a dar uma entrevista televisiva para fazer ouvir a sua posição. Não deixa de ser curioso que os protagonistas se sintam obrigados a falar publicamente na televisão, como forma de escapar ao ruído de fundo próprio da política portuguesa de hoje, associado a uma cobertura mediática cheia de desinformação.

4É até interessante verificar que no caso BPN o Parlamento se prestou rapidamente a obter esclarecimentos do governador do Banco de Portugal, o polícia do sistema bancário, parecendo desvalorizar a muito mais importante descoberta da responsabilidade dos prováveis ladrões.

5Paralelamente, surgem boatos ligando o Presidente da República, e até a sua familia, à estrutura accionista do BPN, como se a a orientação politica maioritária na estrutura accionista ou na administração do banco, fosse importante para a descoberta da verdade.

6Ainda mais grave, procura-se pôr desde já em causa a figura de Dias Loureiro, como Conselheiro de Estado e mesmo como pessoa detentora de um percurso irrepreensível em termos pessoais e profissionais, apenas porque teve responsabilidades como administrador de empresas do grupo BPN e se mostrou disponível para prestar esclarecimentos.

7Mais uma vez, como em muitos outros casos, acaba-se por discutir mais a parte acessória do problema. De uma lado, a culpa é toda de Vitor Constâncio. Do outro logo se ouve falar em Dias Loureiro. Falta saber a quem interessa esta estratégia permanente de sensacionalismo, se aos politicos que temos, se à imprensa que temos.

 

"IM_Pressões de Direita" in Jornal de Amarante de 27 Novembro 2008